Quando ficamos sabendo que a Paulinha tinha escoliose e que iria usar aparelho de coluna, liguei em Goiânia para minha prima Eulália a mãe da Juliane que havia usado o aparelho para saber mais, pois ela tem escoliose... e a Juliane mandou um email lindo para a nossa família que compartilho com vocês. Juliane tem 18 anos.
Essa mensagem é destinada principalmente para alguma adolescente que esteja usando o aparelho para escoliose ou que precise usar e não queira...com certeza vai ajudar muito, como nos ajudou em 18 de Janeiro de 2011, dia em que recebemos o email que compartilho aqui no blog.
O aparelho para a Paulinha não adiantou....mas adianta para a maioria das pessoas, basta usar corretamente, por mais que seja difícil.
Para Paulinha e Família...
Oi Paulinha, eu fiquei sabendo que você agora vai começar um tratamento pra coluna. Eu não sei se você lembra, mas eu também tive que fazer esse mesmo tratamento que você vai fazer.
Quando eu comecei teria sido muito bom pra mim se alguém que já passou por isso conversasse comigo, e é por saber que pode ser bom que vou conversar com você e também por ter um imenso carinho por você e pela sua família que eu resolvi escrever esse email pra vocês. Espero que te ajude de alguma forma a aceitar mais isso que você está vivendo, se não agora futuramente. Então resolvi te contar um pouco da minha história quando eu comecei a usar o colete para coluna.
A Escoliose é uma doença sem causa e por isso absolutamente ninguém é responsável por você ter desenvolvido escoliose. O que se sabe é que ela pode se desenvolver em alguém durante o estirão de crescimento (na adolescência) ou então a pessoa pode nascer com a doença e é mais comum em mulheres. São algumas curiosidades que o seu médico já deve ter te falado.
Há maios ou menos 5 anos e meio meu pai começou a reparar que além de emborcada eu estava meia tortinha, então minha mãe me levou a um ortopedista e chegando lá ele pediu um Raio-x da coluna, que comprovou que eu tinha escoliose. O Ortopedista então me encaminhou a um especialista de coluna. O interessante é que eu escolhi a dedo o especialista de nome estranho dentro de uma lista de nomes, mal sabia eu que esse médico seria um anjo na minha vida.
Fui ao especialista, Dr. Zeno, e daí veio o grande choque eu teria que usar um colete pra coluna, ele explicou várias coisas sobre a doença e disse que eu teria de tratar porque eu estava com 40º e se passasse disso seria caso cirúrgico (cirugia é arriscada) e se eu não tratasse a doença tinha grande chance de desenvolver mais ainda e causar outros problemas graves de saúde. Eu fiquei muito mal, chorava o tempo todo, só a ideia de que roupa alguma ficaria bonita em mim me desesperava, eu tinha 12 anos e é uma idade que a gente começa a ter vaidade com o nosso corpo. Mas eu não tinha saída tinha que usar e pelo menos não era aquele outro que vinha até o pescoço. Eu pensava, poderia esconder o colete usando roupas mais largas.
Os primeiros 6 meses eu usei o colete direitinho, fazia tudo que tinha que fazer, cronometrava no relógio o tempo que eu poderia ficar sem ele, às vezes eu repartia as duas horas de descanso em 30 minutos e aí eu poderia tirar 4 vezes ao dia o colete, mas esse horário era cronometrado no relógio. Eu fiz isso porque eu tinha esperanças que eu usando direitinho eu poderia tirar no final de seis meses quando seria a próxima consulta.
No final desse semestre eu voltei ao médico e minha mãe cada vez mais angustiada, porque eu me tornei uma pessoa triste, sempre triste, e minha mãe contou tudo pro médico relatou exatamente o que eu estava passando. Ele me disse que esse tratamento é demorado e que se eu quisesse seguir com o tratamento eu não poderia alimentar esperanças de tirar o colete tão facilmente com tão pouco tempo.
Depois disso ficou mais difícil Paulinha, por várias vezes eu quis desistir do tratamento o único motivo que eu não desisti foi pela minha família que me apoiava e contava com a minha ajuda para o tratamento dar certo.
Por dois anos eu usei esse colete que envolvia só o abdômen, apesar de ser mais discreto que o outro eu sofria assim mesmo. Pro colégio eu só usava blusão de frio pra tampar totalmente o colete. Todas as meninas da minha idade usavam roupas bonitas e eu tinha que passar 22 horas de cada dia dentro daquilo. Eu comecei a usar esse colete porque eu tinha escoliose só lombar (tinha só a curva de baixo do S).
Mas o tempo foi passando e eu fui me acostumando com aquilo, e me confortava saber que se eu seguisse com o tratamento meu problema estaria estável e eu usaria só esse colete e pronto.
Usando esse colete eu comecei a ver que eu estava de fora de muitas situações como por exemplo a futilidade que agente vai adquirindo quando se entra na adolescência, eu não tinha que me preocupar em entrar na disputa da maioria das meninas da época: como qual o corpo mais bonito ou quem é mais popular na escola, ou quem é a garota mais cobiçada pelos garotos.
A minha única preocupação era me esconder para que ninguém visse o que eu usava. Eu era insegura, e se antes eu já me achava feia depois que eu comecei a usar o colete esse sentimento de inferioridade piorou. Mas eu tive que passar por tudo isso durante esses dois anos pra aprender a dar valor no que realmente importa na minha vida, a dar valor nas pessoas que me apoiaram e que me deram a força que eu precisava, eu aprendi a valorizar a minha família. E não há ninguém Paulinha, que vai lutar mais com você, que vai te dar mais força pra não desistir do tratamento do que os seus pais a sua irmã e os seus avós. E eu descobri isso durante esses dois primeiros anos do tratamento.
No final de dois anos apesar dos graus meus graus regredirem, o que não é comum, a escoliose passou a não ser somente em baixo e o S se formou, foi a partir daí que o que eu mais temia aconteceu. O colete que envolvia só o abdômen não seria mais suficiente para o meu problema e o médico me deu duas opções:
- 1ª (cirurgia de risco, toda cirurgia na coluna é muito arriscada e tinha possibilidade de não dar certo)
- 2ª opção (usar o colete que vem até o pescoço, o Milwaukee). Eu não pensei duas vezes, e escolhi fazer a cirurgia e o meu médico já esperava isso.
Se fazer a cirurgia resolveria o meu problema de vez, eu queria qualquer coisa menos usar aquele colete. O meu médico disse que o antigo colete seria a mesma coisa de eu não usar nada e então até a data da cirurgia que seria no meio do ano de 2009 eu usaria o Milwaukee. Eu aceitei se fosse pra usar somente por seis meses e depois eu faria a cirurgia e pronto acabou o problema, de cara eu aceitei.
Mas no mesmo dia foi batendo um medo da cirurgia e uma revolta enorme porque se eu já ia fazer a cirurgia eu não admitia usar aquele colete que vinha ate o pescoço eu falei com a minha mãe que eu faria a cirurgia, mas que não usaria mais colete algum. A minha mãe decidiu voltar no médico com o meu pai, mas sem a minha presença. O médico explicou a intenção dele ao falar de cirurgia pra mim. Ele sabia que eu optaria por fazer a cirurgia, mas me convencendo a usar o colete seis meses e tendo resultados bons ele falaria a verdade que a cirurgia era inviável pra mim e me convenceria a continuar usando o colete. A Minha mãe perguntou se fosse o filho dele no mesmo caso que eu se ele operaria e ele disse que não, que convenceria a usar o colete porque seria o melhor tratamento.
Meus pais abriram o jogo comigo e foi o segundo choque. Nada me fazia usar esse segundo colete, eu queria morrer, mas não queria usar aquela "gaiola" e estava sem saída, eu não admitia usar o colete e não podia fazer a cirurgia. Por várias noites eu perdi o sono pensando em uma saída e minha mãe também pensando em como faria pra me convencer a usar o colete.
Foi tão difícil, porque eu não aceitava o tratamento de forma alguma. Foi então que nessa angustia, eu fui tocada por Deus. E cada pessoa com sua fé e eu dentro da minha fé tenho certeza absoluta que Deus falou comigo através da minha consciência. Eu sempre fui uma pessoa muito teimosa Paulinha... e eu me perguntei se eu que sempre fui muito teimosa sempre desafiava tudo e todos, se nessa hora eu seria capaz de me desafiar. Essa pergunta foi como um sopro na minha consciência que mudou em uma questão de segundos a minha forma de ver as coisas.
Foi então que eu aceitei esse desafio de usar esse segundo colete e desta vez eu teria de encarar a situação eu não teria como esconder.
No início foi difícil porque os olhares das pessoas acabavam comigo. Alguns olhares de curiosidade, outros de repulsa. Ambos acabavam comigo porque eu sempre fui muito tímida e não suportava as pessoas me olhando ainda mais porque não estavam olhando com um olhar de admiração. Usar aquilo era feio, era estranho e diferente. E tudo que é diferente causa estranhamento. Esse estranhamento das pessoas me deixava muito mal.
E agora você vai entender porque o meu médico foi um anjo. Além de médico ele foi meu amigo, meu conselheiro e terapeuta. Uma das coisas que ele me disse eu nunca mais vou esquecer e agora eu vou falar pra você.
"Ninguém tem o direito de medir o seu sofrimento de falar se você está sofrendo a toa ou que você tem motivos de sobra pra sofrer, mas o que eu posso te falar é que sempre vai ter pessoas que terão motivos maiores que os seus pra sofrer e algumas dessas pessoas são muito felizes. Não importa o tamanho do seu problema mas o tamanho do seu sofrimento depende exclusivamente da forma como você enxerga o seu problema e não importa o quanto doa superá-lo o que importa é que ele vai passar. "
Quando ele me disse isso (até hoje eu me emociono de falar) eu lembrei de quando eu fui tirar o molde do primeiro colete, eu me lembro de passar primeiro pelo centro de queimaduras do hospital e ver várias pessoa com 90% do corpo queimado e depois de passar pelo centro ortopédico do hospital e de ver vários cadeirantes e em especial eu me lembro de um garotinho que era paraplégico e ele estava sorrindo. Aquele garotinho não iria andar nunca mais e estava sorrindo e eu que estava tendo a oportunidade de tratar o meu problema não sabia fazer outra coisa a não ser chorar e ficar triste nos últimos três anos.
Aquelas frases do meu médico e essa recordação do dia em que eu fui tirar o molde do primeiro colete que eu usei, foram lições pra mim. E pra perceber e aprender várias coisas Paulinha eu tive que passar por isso que você ta passando.
Eu percebi que eu posso ser muito maior do que qualquer problema que eu venha a enfrentar basta eu querer ser maior. Que a força que agente encontra pra superar tudo, vem da fé que a gente tem em Deus e do apoio de pessoas que são como anjos na nossa vida. Meus anjos foram todos da minha família, meu médico e três amigas que não me abandonaram quando eu comecei o tratamento.
Eu aprendi que não importa o quanto demore e o quanto doa alguns problemas, mas que só a certeza de que vai passar é um grande conforto. Aprendi que muito maior do que qualquer forma de beleza exterior são as nossas qualidades enquanto pessoa, como por exemplo a humildade, a nossa força de vontade, a nossa capacidade de valorizar os sentimentos verdadeiros (como os que a sua família tem por você) a nossa fé , o nosso carisma, a nossa esperança, a nossa persistência, a nossa capacidade de valorizar as coisas simples da vida ...
Percebi que apesar de ter pessoas que me façam sentir mal e me dê motivos pra me chatear, devemos sempre levar em consideração as pessoas que nos fazem sentir bem. No início os olhares das pessoas me faziam sentir mal, mas depois eu sentia era pena delas por terem a beleza como referencia de qualidade de pessoa sem ao menos conhecer a pessoa.
Por isso Paulinha, se hoje alguém me perguntar qual foi a melhor fase da minha vida eu digo que foi a parte da minha adolescência em que eu usei o colete, porque eu pude entender muitas coisas, eu tive a oportunidade de aprender muitas coisas. E se hoje eu sou a pessoa que sou eu devo a experiência desse tratamento. Se fosse pra usar esse colete de novo eu usaria, porque foi uma espécie de armadura pra mim ... me fez uma pessoa mais forte, mais segura de mim mesma, mais confiante em Deus, e me fez ver várias coisas uma delas foi que família é a tradução fiel do amor.
Procure encarar esse tratamento, Paulinha, como uma experiência única na sua vida e que vai te fazer crescer muito, porque vai te ensinar muitas coisas.
Eu desejo a você muita sorte nessa etapa da sua vida. Que você possa ver as coisas que eu consegui ver no decorrer do tratamento, que você se sinta segura com o apoio da sua família. E nunca se esqueça que você é uma pessoa linda, Paulinha, que por traz da sua meiguice e da sua educação tem uma garota muito forte que eu tenho certeza que vai superar esse problema. Não desista, porque você consegue passar por isso! Deus nunca dá uma cruz maior do que a que a gente consegue segurar. Todas as vezes que você quiser conversar comigo eu estou à disposição. Que Deus dê pra você e sua família toda a fé e a força que você precisam pra superar juntos tudo isso! São os votos de uma pessoa que te admira muito!
Com carinho, Juliane.
Se quiserem fazer perguntas para a Juliane, fiquem a vontade que repasso para que ela responda....